A assinatura do decreto que regulamenta a Lei 16.751/10, que institui a alimentação escolar orgânica em todo o sistema estadual de ensino do Paraná, vai demandar um esforço conjunto de agricultores e poder público para fomentar a produção de alimentos sem agrotóxicos no Estado. Hoje, 8% da alimentação escolar é orgânica e 60% é proveniente da agricultura familiar, segundo o governo estadual. A necessidade de crescimento destes índices foi debatida na Assembleia Legislativa do Paraná nesta terça-feira (11), durante a Audiência Pública “Paraná Mais Orgânico”.
A medida regulamentada no ano passado pretende incluir gradualmente orgânicos na alimentação dos alunos das mais de duas mil escolas estaduais, atingindo a meta de 100% da merenda composta por alimentos orgânicos até 2030. No cerne do objetivo audacioso está o Programa Paraná Mais Orgânico (PMO), que há 10 anos se tornou referência em políticas públicas de apoio à produção e certificação orgânica de alimentos.
O PMO, criado e mantido pela a Superintendência Geral da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior do Paraná (SETI) por meio de recursos do Fundo Paraná, tem como foco a formação de recursos humanos e a inovação tecnológica em agroecologia e produção orgânica na agricultura familiar. É desenvolvido com auxílio das sete Universidades Estaduais distribuídas por todas as regiões do Estado, além do Centro Paranaense Referência em Agroecologia (CPRA).
Atualmente, o Paraná é o Estado com o maior número de propriedades certificadas para produção de orgânicos no País. Segundo o portal do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), o Estado é responsável por 17,1% dos produtores de orgânicos certificados, sendo ao todo 3.490 propriedades. Ainda assim, a primeira colocação no ranking de produtores orgânicos não é o suficiente para atingir as metas da Lei da merenda escolar orgânica.
A demanda de crescimento foi observada pelo professor Rogério Macedo, membro do comitê gestor do Programa Paraná Mais Orgânico. “Temos de aumentar o volume de produção para atender às exigências da Lei recentemente regulamentada. Os produtores serão muito demandados”, disse. “Entendemos que o Estado tem de fomentar a produção, promovendo a transição de uma produção que privilegia agrotóxicos para a agroecologia”, observou o proponente da audiência, deputado Goura (PDT). Para isso, há o consenso de que serão necessários mais investimentos na formação de agricultores.
A Diretora de Políticas Ambientais da Secretaria de Desenvolvimento Sustentável e Turismo, Fabiana Campos, que representou o secretário Marcio Nunes, destacou que a pasta promove políticas ambientais e de agricultura sustentável. Para ela, ao fomentar a produção orgânica, é necessário olhar para as particularidades de cada local. “Quando se fala em agricultura sustentável, não tem como não falar de um Paraná mais orgânico, valorizando o hábito alimentar de cada região. Não tem como falar de alimentação escolar e achar que a criança de Curitiba tem o mesmo hábito alimentar de uma criança em Francisco Beltrão. Temos que olhar para isso também, além de uma política pública de inserir alimentação 100% orgânica progressivamente, tem que olhar para um desenho de uma política pública de incentivo regional, que cada localidade do Paraná possa ter essa participação”.
Neste sentido, Fabiana diz que a Secretaria está de portas abertas para trabalhar no crescimento da produção. Para ela, o assunto vai além da alimentação. “Ao falarmos de orgânicos, não é só a produção do alimento, é todo um contexto do desenvolvimento sustentável. A gente fala do econômico, social e do ambiental juntos”.
Fabio Corrales, do Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar), explicou que o órgão já desenvolveu um trabalho na orientação e capacitação os produtores, além de apoiar as auditorias e certificações da produção de alimentos orgânicos por meio do Programa Paranaense de Certificação de Produtos Orgânicos (PPCO). O PPCO envolve a SETI, o Centro Paranaense de Referência em Agroecologia (CPRA), vinculado à Secretaria Estadual da Agricultura e do Abastecimento (SEAB), e o Tecpar, que é o órgão certificador. “Esta certificação permite que os produtores forneçam para o Estado, criando acesso a mais mercados e auxiliando na promoção do incremento de renda”, comentou.
O primeiro secretário da Assembleia, deputado Luiz Claudio Romanelli (PSB), lembrou a importância de outros programas para o estímulo da agricultura familiar, como os de modalidade de compra direta. Um deles é o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que tem como finalidades promover o incentivo à agricultura familiar. Para isso, promove a compra de alimentos produzidos por famílias de agricultores e destina às pessoas em situação de insegurança alimentar e nutricional. “Este é um tema muito relevante. Reconhecemos a militância de produtores que acreditam na importância do alimento orgânico. Também sabemos dos esforços do governo para garantir uma alimentação saudável nas escolas. Cada vez mais temos de avançar”, disse o deputado.
O membro do Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural e Agricultura Familiar (CEDRAF), Marcelo Passos, defendeu que para que o Paraná atinja seus objetivos de uma merenda 100% orgânica, o diálogo entre os atores envolvidos deve ser constante. “Precisamos da manutenção e ampliação do Programa Paraná Mais Orgânico, assim como a destinação de mais recursos”, avaliou.
A agricultora agroflorestal, feirante e coordenadora da Rede Ecovida Karina David concordou. “O apoio às políticas públicas de fomento de orgânicos é importantíssimo para nosso Estado. Com a Lei, os orgânicos vão para pessoas que muitas vezes não poderiam consumir esse tipo de alimento. Vocês não podem imaginar a felicidade do produtor. É a democratização do acesso à alimentação”.
Participações – A audiência pública contou com ainda com participação do gerente estadual de agroecologia do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDRF-IAPAR-EMATER), Rogério Macedo, e dos deputados Nelson Luersen (PDT), Professor Lemos (PT) e Reichembach (PSC).
No Brasil – Os brasileiros estão comendo mais alimentos produzidos sem a utilização de agrotóxicos. De acordo com um estudo promovido por uma entidade de fomento do setor de orgânicos no País, em torno de 19% da população já consome algum destes produtos no intervalo de um mês. Segundo a Organis, associação que promoveu a pesquisa, em 2017 o número não passava de 15%.
Ainda segundo o estudo, entre as pessoas que não consomem nenhum tipo de produto orgânico, 43% justificam o preço dos alimentos, 21% a dificuldade de encontrar os produtos e 7% por falta de costume.